Todas as capitais da Amazônia estão entre os piores municípios em saneamento básico, segundo ranking do ‘Trata Brasil’

 Todas as capitais da Amazônia estão entre os piores municípios em saneamento básico, segundo ranking do ‘Trata Brasil’

O investimento anual destinado a uma parcela dos cidadãos da Amazônia equivale a um terço do que se investe para cada habitante das 20 primeiras cidades posicionadas no Ranking 2022 do Saneamento (Vilma Ribeiro/Voz das Comunidades/Reprodução)

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Iury Lima – Da Revista Cenarium

VILHENA (RO) – Má qualidade da água e esgoto sem tratamento: esta é a realidade de boa parte das populações de 100 municípios brasileiros, elencados pelo novo ranking do Instituto Trata Brasil, como os piores em saneamento básico no País inteiro. Precariedade que afeta todas as capitais dos Estados integrantes da Amazônia Legal, sendo duas delas, Macapá e Porto Velho, as primeiras da lista. 

Na Região Norte, onde estão a maioria dos municípios da Amazônia, a oferta de água potável alcança pouco mais da metade da população: 58,9%, de acordo com a presidente executiva do Trata Brasil, Luana Siewert Pretto. Ela pondera, no entanto, que “o esgoto ainda é problema, em algumas regiões, visto que 100 milhões de brasileiros não têm acesso à coleta e tratamento”. A cobertura de rede de esgoto, no Norte do Brasil, contempla apenas 13% da população, segundo o estudo.

“A Região Norte destoa muito em relação aos índices de saneamento básico, sendo a pior em termos de indicadores. Isso é bastante problemático, quando se tem uma realidade oposta em outras regiões, como, por exemplo, Sul, Sudeste e Centro-Oeste, onde já se tem mais de 90% da população com acesso à água”, avaliou a especialista, que também é engenheira civil, em entrevista à REVISTA CENARIUM.

Falta de acesso à água potável, coleta e tratamento de esgoto impactam, principalmente, o futuro das populações mais pobres (Reprodução)

Piores da Amazônia

Levando em conta apenas as capitais da Região Amazônica, Macapá (AP) abre a lista como a que menos investe em saneamento básico. Até houve mudança, mas foi para pior, visto que, em 2020, a cidade com mais de meio milhão de habitantes ocupa a 2ª posição entre as piores do Brasil. Agora, é a que está na situação mais crítica de todo o território nacional. Porto Velho (RO) aparece logo abaixo de Macapá, seguida de Rio Branco (AC).

(Fonte: Ranking do Saneamento 2022/Trata Brasil)

A situação é mais favorável apenas para Palmas (Tocantins), única capital da Amazônia a entrar para a lista dos 20 municípios brasileiros em situação menos ruim em relação à qualidade do saneamento.

Causas do problema

Entre as disparidades regionais, Siewert aponta a falta de investimentos da máquina pública como uma das principais causadoras de indicadores tão divergentes (e catastróficos quando comparados) de Norte a Sul do País. 

O investimento anual destinado a uma parcela dos cidadãos da Amazônia, por meio das prefeituras, equivale a um terço do que se investe para cada habitante das 20 primeiras cidades posicionadas no Ranking 2022 do Saneamento, portanto, as melhores em qualidade. “Nelas, o investimento médio é de R$ 135 por ano para cada pessoa. Já nas 20 piores, que geralmente são essas que estão localizadas na Região Norte e, na Amazônia [9 municípios], o investimento médio é de R$ 48 por ano, por habitante”, detalhou a presidente executiva do Trata Brasil.

Para Luana Siewert Pretto, presidente executiva do Trata Brasil, faltam os gestores municipais entenderem que investir em saneamento é investir em saúde, desenvolvimento humano e econômico regional (Iury Lima/CENARIUM)

Essa falta de investimentos, na avaliação da especialista, tem origem na ausência de uma política pública bem estruturada e de planos municipais de saneamento básico que estabeleçam metas de modo que sejam acompanhadas e cumpridas. 

“Esse plano tem que estar previsto nos contratos de concessão; a agência reguladora tem que fazer a fiscalização adequada desses contratos e acompanhar a evolução das métricas. Por isso, é muito importante que cada prefeito saiba se o contrato está regular, se vai haver dinheiro para os investimentos necessários, visando garantir a universalização e, que os gestores municipais entendam a importância desse serviço no desenvolvimento de toda uma região: saúde, qualidade de vida e, também, desenvolvimento econômico com acesso a oportunidades para aqueles que ali vivem”, reforçou Siewert Pretto. 

Doenças causadas pela falta de saneamento levaram mais de 270 mil pessoas a hospitais, em 2020 (Reprodução/Agência Brasil)

Falta de acesso impacta o desenvolvimento humano

Em 2020, de acordo com outro estudo publicado pelo Trata Brasil, 273 mil pessoas foram internadas por conta de doenças de veiculação hídrica, por conta da precariedade do saneamento, como cólera, malária, leptospirose, esquistossomose e diarreia. No entanto, os riscos à saúde por não consumir água tratada, nesse caso, pela falta de acesso, e por habitar localidades com esgoto a céu aberto vão muito além: comprometem o futuro, principalmente, das populações mais pobres.

“Há um estudo nosso que correlaciona a nota do ENEM com a falta do acesso à água. Imagine o quão importante é a nota desse exame para um adolescente conseguir uma vaga numa universidade. E se existe essa relação direta, significa que isso acaba prejudicando o próximo passo da vida profissional desse jovem”, lamentou a especialista.

Outra triste realidade indicada pelo instituto é a condição imposta a 2,5 milhões de mulheres que vivem em casas sem banheiro. “Nessa condição, sem acesso à água, sem acesso à coleta e tratamento de esgoto, naturalmente, essa pessoa vai ficar mais doente, vai perder, até mesmo, produtividade no trabalho”, acrescentou Luana Siewert.

“Geralmente é a mulher, mas pode ser o homem, também, que talvez precise caminhar, digamos, 30 minutos, para buscar água para a família (…) Isso prejudica todo desenvolvimento daquela região, tanto por afastamento da pessoa do trabalho ou dos estudos, quanto pelas doenças, pelo tempo que a pessoa vai perder tendo que desenvolver atividades domésticas que ela não precisaria desenvolver se houvesse água na torneira de casa ou coleta e tratamento de esgoto na porta da casa dela. Precisamos compreender que a desigualdade ocorre pela falta de incentivo e de investimento”, finalizou.  

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