Com poucos leitos e população ‘furando’ a quarentena, Amazonas pode ser o primeiro estado a saturar rede hospitalar

 Com poucos leitos e população ‘furando’ a quarentena, Amazonas pode ser o primeiro estado a saturar rede hospitalar
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Paula Litaiff e Leandro Prazeres – Para Jornal O Globo

Brasília — Um dia depois de o governo estadual anunciar que 95% dos leitos disponíveis nos quatro principais hospitais públicos de Manaus já estão ocupados, mesmo bem antes do pico previsto de disseminação do coronavírus, o Amazonas tenta evitar um colapso precoce, mas nas ruas da capital ainda se vê a população “furando” a determinação de isolamento social. O secretário estadual de Saúde, Rodrigo Tobias, afirmou nesta terça-feira ao GLOBO que “teme pelo pior” e, segundo fontes do governo, pode deixar o cargo ainda nesta quarta-feira. O Ministério da Saúde trata o estado como um dos casos mais preocupantes do país.

Apesar de o governo e a Prefeitura de Manaus terem publicado decretos proibindo a comercialização de produtos e serviços não essenciais para conter o contágio do vírus, dezenas de comerciantes do Centro da cidade vendiam alimentos que eram comprados por quem passava pelo local.

A demora em receber ajuda financeira dos governos para poder ficar em casa era a principal justificativa de quem ocupava as ruas.

“Ou eu vendo ou não levo alimentos para os meus filhos. Quarentena é para quem tem dinheiro”, disse Carlos Silva, 43, vendedor de sucos, na Praça da Matriz, a principal do Centro.

Já o vendedor de tucumãs, uma fruta típica da Amazônia, Joelson Gomes, afirmou que ainda há clientes comprando a fruta, inclusive, sem a casca.

“O amazonense não tem frescura, não”, disse Gomes, minimizando os riscos.

Sem uti no interior

Diariamente, fiscais da Secretaria de Feiras, Mercados, Produção e Abastecimento (Sempab) tem retirados os comerciantes do Centro da cidade e das zonas periféricas da capital, mas eles retornam no dia seguinte.

“Só a gente que sabe como é difícil ficar em casa sem ter o ganho das vendas. O que o governo (federal) está oferecendo para gente não sair de casa (R$ 600) é esmola. Não se vive com isso”, declarou a vendedora de verduras, Jane Silveira.

A equipe de investigação epidemiológica do Centro de Informações Estratégicas de Vigilância em Saúde (Cievs) da prefeitura informou que fez o monitoramento de 1.420 notificações de casos da Covid-19. Já são 636 confirmados e 23 mortes, segundo o Ministério da Saúde.

O secretário de Saúde diz que a situação é resultado de uma série de fatores como a baixa quantidade de leitos de UTI e o fato de a epidemia ter chegado ao estado durante o período de chuvas na Amazônia, em que, tradicionalmente, há um aumento no número de casos de outras síndromes gripais.

“Temos uma relação de leitos de UTI por 10 mil habitantes muito pequena se comparada a outros estados. É um problema histórico. Nós não temos leitos de UTI no interior. Quando temos um caso que precise de UTI, a gente traz o paciente de avião para cá. Até agora, a doença atingiu, principalmente, pessoas das classes A e B. Como a gente ainda está na curva ascendente, se o coronavírus pegar as classes menos favorecidas economicamente, onde há residências em que moram muitas pessoas, isso pode ser um grande problema”, declarou ao GLOBO o secretário Rodrigo Tobias. “Eu temo não apenas pelos indígenas. Nós temos fronteira com a Colômbia, com o Peru. Temos divisa com Roraima, que tem fronteira seca com a Venezuela. Eu temo pelo pior”.

Troca no governo

A cúpula do governo do Amazonas confirmou que Tobias deve pedir exoneração do cargo nesta quarta-feira. Procurado novamente pelo GLOBO para comentar a informação, Tobias não respondeu. O governador Wilson Lima (PSC) convidou uma especialista de São Paulo para comandar a pasta.

Enquanto isso, o governo busca alternativas para superar a falta de leitos. Uma parceria com um hospital universitário particular oferecerá 400 leitos para dar retaguarda ao Hospital Delphina Aziz, na Zona Norte de Manaus, que centraliza o tratamento da doença. No Delphina Aziz, pouco se vê a presença de familiares de pacientes. A maioria tem receio de acompanhar o parente e contrair a doença.

“A gente torce que ela fique boa logo, mas infelizmente não estamos tendo condições de estar todos os dias aqui. O medo é muito grande”, disse o industriário Marinaldo Santiago, de 34 anos, que está com a sobrinha adolescente isolada.

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