EDITORIAL – O risco de ascensão da extrema direita na maior capital da Amazônia

 EDITORIAL – O risco de ascensão da extrema direita na maior capital da Amazônia

Extremistas do 8 de Janeiro e o Teatro Amazonas, maior símbolo de Manaus (Composição de Paulo Dutra/Revista Cenarium Amazônia)

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Capital com maior extensão territorial da Amazônia Legal, Manaus (AM) apresenta tendência eleitoral para ascender representantes inclinados à extrema direita, nas eleições deste ano, e três fatores indicam o cenário: a mudança no quadro de pré-candidatos majoritários, a autoidentificação ideológica dos eleitores e o resultado da última eleição presidencial. Os dois últimos elementos ignoram os riscos da doutrina política e a omissão de Jair Bolsonaro (PL) com a população local na pandemia.  

Ideologia cujas características históricas são a oposição ao multiculturalismo, a deslegitimação científica, a xenofobia, o nacionalismo extremo e a descredibilização de instituições democráticas para justificar regimes totalitários, a narrativa de extrema direita de Bolsonaro contou com a afinidade de 61,28% dos eleitores de Manaus nas eleições de 2022.

Bolsonaristas defenderam anulação da eleição presidencial e intervenção militar (Reprodução/Folhapress)

Bolsonaro tornou-se inelegível após atacar o sistema eletrônico de votação. O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) entendeu, em 2023, que o ex-presidente propagou mentiras com a finalidade de desacreditar, sem provas, as urnas eletrônicas, visando desestabilizar a democracia. Ele é investigado ainda por influenciar uma tentativa de golpe no 8 de janeiro de 2023, quando grupos bolsonaristas atacaram a sede dos Três Poderes em Brasília (DF).

Nos últimos dez dias, o ex-presidente foi responsável por intermediar a pacificação entre dois pré-candidatos a prefeito de Manaus pelo partido dele, o Partido Liberal, com vistas à viabilização eleitoral para comandar a cidade nos próximos quatro anos. O coronel reformado Alfredo Menezes e o deputado federal Capitão Alberto Neto se entenderam, no último dia 11 de janeiro, depois de quase um ano de troca de acusações e conflitos dentro da legenda.

Coronel Menezes, Jair Bolsonaro e Capitão Alberto Neto: disseminadores da narrativa bolsonarista de extrema direita e aliados nas eleições de 2024 (Composição de Paulo Dutra/Revista Cenarium Amazônia)

Em 2022, Menezes registrou 735 mil votos (39,21%), no Amazonas, na disputa por uma vaga no Senado da República, sendo a maioria em Manaus, para 770 mil votos (41,08%) de Omar Aziz, que foi reeleito.  Alberto Neto também conseguiu retornar ao Congresso com 147.846 votos para deputado federal. Os dois tiveram apoio do ex-presidente.

Políticos como Coronel Menezes e Capitão Alberto conseguem conquistar o eleitorado manauara, que somam 1,3 milhão, usando a narrativa de Bolsonaro. Atualmente, mais de 40% da população em Manaus se diz de extrema direita, centro-direita e direita, segundo um levantamento da empresa Perspectiva – Mercado e Opinião, realizado em dezembro passado. 

Narrativa bolsonarista

Cientistas políticos defendem a ideia de que Jair Bolsonaro usou o discurso da direita radical para conquistar eleitores aversos ao grupo político liderado pelo partido do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), nas eleições de 2018, chamando a atenção como um “outsider”, político fora dos padrões. Apesar do oportunismo para a época, o ex-presidente mostra afinidade com a ideologia.

No pleito de 2018, Bolsonaro teve como principal “cabo eleitoral” o escritor Olavo de Carvalho (1947-2022), tido como “referência” também para políticos e influenciadores bolsonaristas de Manaus. Olavo era autodeclarado filósofo, esteve internado diversas vezes em clínicas psiquiátricas e difundia o negacionismo científico. Ele foi denunciado pela filha por abuso sexual.

Olavo de Carvalho e Jair Bolsonaro negavam a letalidade da pandemia e tinham outras afinidades (Reprodução/Agência Brasil)

O escritor – que lançou 31 livros sem embasamento científico – é frequentemente citado como o guru dos bolsonaristas, com expressiva influência da extrema direita brasileira, e defendia os pontos abaixo, conforme registros:

1) Teoria da terra plana: disse que não estudou o assunto, mas “viu vídeos” que não refutavam a “tese” dele;

2) Composto de bebidas adulterado: falou que a Pepsi Cola usava células de “fetos abortados” como adoçante nos refrigerantes;

3) “Fim da humanidade”: disseminou que feministas e gays provocaram “a crise da civilização cristã, empurrando a sociedade para o abismo”;

4) Fake news sobre crise climática: não admitia a influência humana nas mudanças do clima;

5) “As maiorias devem dominar as minorias”: usava exemplos de governos ditatoriais para justificar uma espécie de “ordem social”;

6) Teoria conspiratória: afirmava que os principais veículos de imprensa brasileiros seriam comandados por “infiltrados comunistas”; e

7) Negação da Covid-19: defendeu que a pandemia “não passava de historinha de terror para acovardar a população”.

No governo de Bolsonaro, Manaus foi uma das cidades com maior taxa de mortalidade por Covid-19 em um período em que já existia vacina para a doença, 2021. O ex-presidente negava a eficácia da imunização e mandou, no ápice da pandemia, representantes do Ministério da Saúde entregar o “Kit Covid” aos manauaras, com cloroquina e ivermectina, esta última, indicada para matar piolhos.   

Manaus foi uma das cidades com maior taxa de letalidade da Covid-19 (Sandro Pereira/Revista Cenarium Amazônia)
(*) Paula Litaiff é diretora-executiva da REVISTA CENARIUM AMAZÔNIA
Revisado por Adriana Gonzaga

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