EDITORIAL – A crise da infraestrutura em Manaus, um projeto

 EDITORIAL – A crise da infraestrutura em Manaus, um projeto

Moradores do bairro Santa Etelvina, Zona Norte de Manaus (Foto: Ricardo Oliveira/Cenarium)

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Ao percorrer os bairros de Manaus, entre crateras abertas, veículos abandonados e o cheiro persistente do esgoto a céu aberto, o repórter não encontra somente sinais de precariedade, mas testemunha o fracasso de uma política pública que perdeu sua função social. A nova edição especial da CENARIUM expõe, com dados oficiais e imagens estarrecedoras, o abismo entre os números bilionários movimentados pela Secretaria Municipal de Infraestrutura (Seminf) e a realidade dos Distritos de Obras da capital amazonense.

Para o antropólogo e escritor Darcy Ribeiro, o Brasil não fracassou. Ele foi, desde o início, um projeto de sucesso, mas um sucesso do ponto de vista das elites, que sempre trabalharam contra o povo e a favor de si mesmas. A crise da infraestrutura urbana em Manaus, mesmo após a movimentação de mais de R$ 1,2 bilhão em 2024, evidencia o triunfo desse projeto perverso, no qual o abandono de serviços essenciais nos bairros periféricos não é uma falha, mas uma escolha política deliberada. Uma política que privilegia o asfalto do bairro Ponta Negra, área nobre, enquanto a lama invade a casa da aposentada Teresinha, no bairro Praça 14.

A omissão da gestão municipal diante do abandono das sedes dos Distritos de Obras não pode ser dissociada da lógica clientelista que Darcy Ribeiro denunciava em sua crítica às estruturas de poder. O Estado, diz ele, “foi feito para não funcionar” para os pobres, e isso se expressa com clareza na Zona Norte de Manaus, onde distritos como os da Cidade de Deus e Cidade Nova estão literalmente engolidos pela vegetação e pela ferrugem de máquinas inutilizadas, ao mesmo tempo que contratos milionários seguem firmes com grandes empreiteiras.

A promessa de reforma nos 18 Distritos de Obras da capital, sem data definida, tornou-se retrato simbólico do descaso. Uma promessa tão frágil quanto os muros do Distrito do Morro da Liberdade, sustentados por estacas de madeira e tapumes improvisados com placas da própria Seminf. Enquanto isso, a Prefeitura de Manaus acumula empréstimos bilionários. Como bem observava Darcy, “a crise da educação no Brasil não é uma crise, é um projeto”. O povo de Manaus, porém, não é passivo. É povo que denuncia, que grava vídeos, que chora nas portas das repartições, que sobrevive à lama e ao esquecimento. Cabe à imprensa cumprir seu papel, como faz a CENARIUM, de ser ponte, denúncia e memória. Porque, como dizia Darcy Ribeiro, “só há duas opções nesta vida: se resignar ou se indignar. E eu não vou me resignar nunca”.

O assunto foi tema de capa e especial jornalístico da nova edição da REVISTA CENARIUM. Acesse aqui para ler o conteúdo completo.

(Reprodução/Revista Cenarium)
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